Uma típica cena suburbana desenhada por Jano.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

O discurso da forma

"Nada se mudaria; o regímen, sim, era possível, mas também se muda de roupa sem trocar de pele." (Machado de Assis, "Esaú e Jacó")

Todos os dias são iguais: o sol nasce e morre. Mesmo quando escondido atrás das nuvens, lá está ele a desfilar sobre as nossas cabeças. Tudo bem, alguns dirão que, na verdade, o sol está parado e que é a terra que gira. Mas o que importa saber isso quando os nossos olhos continuam nos dizendo que ele simplesmente vai? Mas volta...

Assim é: todos os dias são exatamente iguais. E o que faz com que, mesmo sendo tão iguais, nós os tenhamos tão diferentes? Não é só o que fazemos deles, mas como os experimentamos. E aí está o discurso da forma.

Os seres humanos sentem. De fato, todos os seres humanos sentem muito e tudo. Uma pessoa de rua não tem menos ciúme de sua companheira do que teria o namorado de uma grande "top model". Se um poeta romântico recita versos ou um seresteiro canta à luz da lua, um menino dá um puxão de cabelo, mas todos querem simplesmente amar.

O coelhinho que se faz com guache, um dia vira prova e só vai crescendo e mudando de nome: monografia, dissertação, tese, livro. O troninho é o neto vaso sanitário. A música lenta dos bailes, que já foi valsa de salão, hoje é dançada até o chão. E os relacionamentos... seguem a mesma lógica desde Adão e Eva!!!

Mas, apesar de toda essa profunda igualdade, é a diferença que constrói a magia de viver. Por isso, mesmo que no fundo saibamos o que nos espera no fim, jamais saberemos como será o durante. A forma que se imprime em um dia não se aplica a outro. Ou, parafraseando de Thiago de Melo, se novo não pode ser o caminho, novo será o jeito de caminhar.


sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

"História dos Subúrbios"

"Subúrbio carioca", Di Cavalcanti

Pois sim. Finalmente tomei coragem de criar um espaço onde minhas palavras possam não apenas chegar às pessoas, mas, sobretudo, juntar-se a outras. O diálogo que se pode travar, na medida em que meus textos toquem as pessoas e provoquem nelas alguma reação, é ao mesmo tempo maravilhoso e desafiador.

Um querido amigo das letras, Flávio Carneiro, disse uma vez que o escritor é uma espécie de leitor frustrado por não ter na estante aquilo que queria ler e por isso escreve. Concordo. Pode ser. Mas também não teria ali um pouco de vaidade, pretensão, ousadia? Quando alguém se lança ao deitar no papel as suas ideias, não as quer somente claras, mas, acima de tudo, belas. Isso é o que nos dá a literatura: a beleza da forma.

Afinal, a literatura nasce da busca do artista por uma forma singular. Por isso, tantos estilos e técnicas, para no fundo abordar sempre o mesmo assunto: o homem e a sua relação com o existir.

Por exemplo, Bento Santiago tinha uma história até mesmo comum para a condição humana, embora não a aceitemos. Mas ao invés de lermos em "Dom Casmurro" um caso de traição, lemos o monólogo da suspeita. E ao esboçar um livro que tentasse dar ordem ao seu interior caótico - já que todo o externo vai bem com as tintas -, embora fosse simples exercício de escrita para uma outra obra de maior relevância, sem se dar conta, Bento elabora o romance mais inquietante da história de nossas letras.

Mas o que motivava autor ficcional machadiano realmente? Elaborar a "História dos Subúrbios". E o que foi escrito? Nada. Por isso, pra mim, o título que batiza este blog simboliza e sintetiza a minha fome de escritor iniciante: o desejo de elaborar algo que ainda não sei bem o que é, mas que, justamente por isso, precisa ser escrito.

Vamos tentar.