Uma típica cena suburbana desenhada por Jano.

quarta-feira, 30 de março de 2011

O nariz do palhaço



"Cara de palhaço, pinta de palhaço, roupa de palhaço

Foi esse o meu amargo fim"

(Luiz Reis e Haroldo Barbosa)


Ainda cheio de sonhos e utopias, meu amigo mais parecia um recém-formado, apesar de já ter mais de dez anos de experiência. Recebeu o paciente e realizou atenciosamente uma pequena entrevista, tomando nota de cada mínimo detalhe. Em seguida, examinou-o minuciosamente: fez a medição da pressão arterial, auscutou o coração e os pulmões, checou a pulsação, analisou os olhos, verificou a garganta etc. Enfim, chegou a um diagnóstico e prescreveu uma dieta básica e alguns exercícios.



O paciente não seguiu a recomendação e o que é pior: acabou piorando. O médico tentou outra coisa: mudou a dieta e cortou alguns exercícios que exigiam um pouco mais de esforço. Quem sabe adaptando a prescrição à realidade do paciente, as coisas fiquem mais fáceis. Não funcionou. O paciente não fez nada do que lhe foi receitado. Já sabia o que fazer: substituir a dieta por remédios, assim o paciente não precisaria se preocupar em fazer dieta alguma. E também só deixou na lista os exercícios mais simplórios, só para não deixar o paciente sedentário. Resultado: zero.



Recorreu, enfim, ao método do doutor Patch Adams – aquele médico colocava nariz de palhaço e fazia graça para aliviar o sofrimento dos pacientes; virou até filme, interpretado por Robin Willians. Além do nariz vermelho, passou a usar um jaleco colorido, sapatos bem grandes, anteninhas e óculos de mola. O paciente adorou, achou graça de tudo e ficou certamente cheio de felicidade. Mais feliz e muito mais doente, porque, ao voltar para casa, continuou a não seguir as recomendações médicas.



Meu amigo me telefonou, perguntado o que deveria fazer agora. Já tinha tentado de tudo e o paciente só ia de mal a pior, parecia que nem se importava com a própria saúde. Assim ele iria morrer. Como seu médico, será ele seria responsabilizado por essa morte? Infelizmente, tive de dizer ao amigo que não poderia ajudá-lo em nada, no máximo ser solidário, até porque há alunos que adotam exatamente a mesma postura desse paciente, enquanto nós continuamos a usar pedagogicamente um nariz de palhaço. E para piorar, no nosso caso não resta a menor dúvida: a culpa é sempre do professor.



Márcio Hilário


30-03-2011

terça-feira, 29 de março de 2011

Banheiro de Paes



“– Mãe, quero fazer cocô. – Tá bom, vamos! – Não, eu quero ir na casa do Pedrinho!”. Quem não se lembra desse diálogo escatologicamente fofo entre mãe e filho no comercial do “Glaid”? Apesar de demonstrar aquela inocente inveja típica das crianças, que adoram as novidades perfumadas da latrina alheia, o nosso “Barrozinho” – mais amigo do rei que Manuel Bandeira – nem sequer reivindicou para si um trono semelhante ao do pequeno monarca, mas sim queria ter um livre acesso ao mais íntimo dos aposentos reais.


E já que falamos da nobreza, lembremos também do clero, como no filme “O Banheiro do Papa”. Ali naquela cidadezinha da fronteira Brasil-Uruguai, os pobres moradores fizeram de tudo para ganhar alguma graninha com a visita de Sua Santidade. Claro! Afinal, os jornais anunciavam que centenas de milhares de peregrinos viriam de todas as partes só para receber as bênçãos do Pontífice. E como nem só de fé vive o homem, muitos quitutes foram preparados e colocados à venda por quem podia e quem não podia. Já quem podia ainda menos teve de se preocupar com o número dois e construir um puxadinho no quintal de casa para aliviar o corpo e a alma dos fiéis. O problema é que o espetáculo religioso não teve a magnitude anunciada pela mídia e o banheiro do papa acabou permanecendo imaculado,virgem e santo.


Finalmente, depois da nobreza e do clero, o saneamento básico de nossa pirâmide medieval se completa com a plebe, sempre rude e apertada. Como nem todo mundo pode contar com um amiginho solidário e receptivo e como o banheiro do papa fica há milhares de quilômetros do Rio de Janeiro, ao folião, que não queria ter o seu pinto engaiolado no carnaval carioca, só restou apelar à boa fé do prefeito com a seguinte plaquinha em punho: “Xixi aqui não, só na casa do Eduardo Paes”. Pode ser apenas fofoca desse povo, mas dizem que o Pedrinho não sai de lá.


Márcio Hilário


29-03-2011